
No dia 25 de julho de 2024, a Embrapa Cerrado realizou um encontro com pesquisadores e representantes do governo federal para celebrar o Dia Internacional da Agricultura Familiar, instituído pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). O evento teve como objetivo reconhecer a importância desse segmento em todo o mundo, especialmente no Brasil, que é responsável por 67% da mão de obra no campo, ocupa 3,8 milhões de estabelecimentos e produz 70% da mandioca, 64% do leite e 51% da proteína suína, com apenas 23% das áreas agrícolas do país.
O pesquisador da Embrapa, Altair Toledo, participou da programação com uma apresentação sobre a Experiência de Melhoramento Participativo em Catalão, Goiás, destacando a implementação dos Corredores Agroecológicos em parceria com a Agrobio, a Aepago e o MCP. Na ocasião, ele dividiu o tempo de fala, permitindo uma colaboração de cinco minutos para o MCP, com a intervenção colaborativa de Lidenilson Silva, pela direção nacional.
Falar em espaço institucionalizado e interno exige cuidados, organização e disciplina no pensamento a ser apresentado. Nesse sentido, este texto é um rascunho da organização da intervenção, como parte da memória e acúmulo do movimento sobre inovação e tecnologia socioprodutiva no contexto do desenvolvimento agrícola e rural do Brasil.
O tempo gentilmente concedido por Altair foi suficiente para transmitir oralmente as perspectivas do MCP sobre os corredores agroecológicos. Corredores agroecológicos referem-se a uma metodologia que une ciências e cientistas a partir da interpretação popular: de um lado, os cientistas sistematizadores que, institucionalmente, dão notoriedade à pesquisa por diferentes meios e instrumentos; e, de outro, os cientistas experimentadores, que são os camponeses que, todos os dias, trabalham em campo aberto em interrelação com o modo de vida familiar.
Isso nos leva a refletir sobre o sentido do conhecimento com duas perguntas: a serviço de quem deve estar a ciência e a pesquisa? Qual é a intencionalidade do conhecimento produzido e a quem está endereçado? Essas são questões emblemáticas que colocam no centro da reflexão o resultado final da aplicação dos recursos e das estruturas públicas diante de dilemas como a questão climática, os crimes ambientais e a segurança dos alimentos e das sementes produzidas.
Em seguida, foram abordadas as experiências dos corredores agroecológicos como uma tecnologia social potencial na transição agroecológica, destacando cinco dimensões:
a. Social: fortalece as relações coletivas nas unidades produtivas familiares. Leva em conta os saberes e conhecimentos tradicionais dos povos e comunidades. Cultiva a cultura alimentar local, as tradições e o modo de fazer.
b. Econômica: tem a capacidade de gerar renda com a diversidade e integração de sistemas e espécies. Cumpre um papel no abastecimento alimentar, inclusive no enfrentamento da insegurança alimentar.
c. Ecológica: favorece a integração de sistemas, atuando em três perspectivas: recuperação da saúde do solo, efeito direto na resiliência aos efeitos climáticos e controle biológico das espécies e insetos.
d. Tecnológica: proporciona melhores condições de trabalho e produção. As inovações tecnológicas e as tecnologias sociais são imprescindíveis para a transformação dos sistemas de produção convencional. Representa um meio de incentivo à sucessão rural da juventude e das mulheres.
e. Política: é uma proposta que enfrenta o modelo convencional como caminho para o sistema agroecológico de vida. É uma referência na formulação e na narrativa de uma nova abordagem, com capacidade de convencimento dos camponeses e comprovação de eficácia na formulação das políticas públicas.
Em 16 anos do MCP, celebrado no último dia 22 de julho, já foram produzidas mais de quatro mil toneladas de sementes crioulas no Brasil. Foram mais de quatro milhões de quilogramas de sementes distribuídos por todo o território nacional, com a estratégia de disseminação das sementes crioulas, proteção e uso nos sistemas agrobiodiversos. Mesmo assim, há uma necessidade de políticas públicas e subsídios estatais para impulsionar o resgate, a conservação e a multiplicação das sementes crioulas e dos conhecimentos tradicionais associados no país, além da proteção contra contaminações por Organismos Geneticamente Modificados, que representam uma forte ameaça à soberania dos povos.
Ao menos quatro desafios são identificados como centrais na ocasião dessa apresentação:
O primeiro refere-se à capacidade da agricultura camponesa e familiar para encontrar soluções para crimes ambientais e climáticos. A agricultura camponesa pode desintoxicar a humanidade e o planeta com sua maneira de produzir, viver e aprender, observando os elementos da natureza e seu uso cotidiano. Somos geradores e guardiões da saúde do solo, do ar, das águas e dos alimentos saudáveis.
O segundo desafio está relacionado à produção de alimentos saudáveis para o abastecimento dos setores pobres, trabalhadores e populações das periferias com baixo ou nenhum acesso. O acesso a alimentos de qualidade não pode ser restrito a quem tem poder aquisitivo. Deve-se considerar não como uma marca para sustentar um nicho de mercado, mas como uma concepção de sistemas de produção agroecológicos.
O terceiro trata do fortalecimento da mobilização nacional em defesa das sementes crioulas, por meio de uma ampla campanha contra as contaminações e a erosão genética, subsidiada por políticas públicas em defesa do patrimônio genético sob os cuidados dos guardiões e das guardiãs da agrobiodiversidade, que são as sementes locais.
O quarto desafio corresponde à democratização e universalização do acesso às tecnologias e inovações, por meio da criação de máquinas e equipamentos adaptados à agricultura camponesa. O desenvolvimento de tecnologias adaptadas é um caminho para promover a qualidade de vida no campo e incentivar a sucessão rural de jovens e mulheres.
Brasília – DF, 25 de julho de 2024.
Lidenilson Silva,
Direção Nacional do Movimento Camponês Popular.
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