Notas sobre a conjuntura é uma síntese organizada pela Direção Nacional do MCP sobre elementos nacionais e internacionais com uma abordagem que dosa questões da conjuntura com elementos da estratégia.
1. A “falência” do Silicon Valley Bank e Signature Banknos Estados Unidos e do CreditSuisse na Suíça tomados pelos controladores financeiros, após as instituições não terem como devolver o dinheiro depositado, ocorreuem meio à retirada do dinheiro em massa pelos clientes motivados pelo anúncio de possível falência.
2. A princípio, parecem fatos isolados sem relação com a nossa realidade. No entanto, o resultado da quebra de bancos é o aprofundamento da crise sistêmica do capitalismo mundial com efeito em todo o globo. Portanto, servem como sinais de alerta a serem observados.
3. Em situações como essas, a reação do capital é rápida. O mercado financeiro pressiona os bancos centrais e os governos nacionais a injetarem recursos públicos com objetivo de salvarem os bancos privados. O estado funciona como salvaguarda dos bancos diante do risco de falência.
4. O risco de colapso da economia mundial é eminente. A falta de capital circulante e o encolhimento das economias locais retraem a capacidade de crescimento econômico dos estados. Postos de trabalho com carteiras assinadas e a geração de empregos são atingidos negativamente, ocasionando risco de recessão.
5. As altas taxas de juros são fatores que contribuem para este risco. Citamos o Brasil como exemplo, pois o Banco Central impõe uma taxa de 13,75%[1] sendo a maior do mundo. Na prática, é um empecilho para novos investimentos e crescimentos em diferentes seguimentos da econômica brasileira.
6. O futuro do dólar. O dólar, depois da crise do ouro (em séculos passados) tornou-se a moeda corrente hegemônica para transações comerciais internacionais. Mas, existe um movimento de desvalorização do dólar como fator padrão no mercado mundial. Esse movimento tem variáveis em âmbito regional a exemplo do Brasil e Argentina e em escala global no caso do bloco: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (BRICS).
7. As iniciativas tendem a pressionar o dólar para abaixo. A baixa do dólar também tem relação com as mudanças de políticas de preços adotadas pelos países, com uso de indicadores como valor do salário mínimo e o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). O resultado da baixa do dólar representa preços dos produtos mais baratos.
8. A baixa no preço dos combustíveis é um exemplo. O abrasileiramento do preço conteve os aumentos sistemáticos do que vinha ocorrendo. Em outras palavras, significa maior autonomia na determinação dos preços dos produtos nacionais, em relação ao mercado externo.
9. Na geopolítica internacional, destacamos a atuação do estado chinês em relação às novas cadeias de valores mundiais. Percebam que enquanto o neoliberalismo aplica a política do Estado mínimo na América Latina (com as privatizações), a China amplia forças por meio da aquisição de setores e bens naturais estratégicos em torno do mundo.
10. A China, nessa perspectiva, opera como agente de negócio nas economias mundiais. Estabelece ações bilaterais de comércios, interferência nas políticas econômicas locais e regionais, tanto para interesse estatal como privado. Com isso, pontua na liderança em mercados como na América do Sul, em 1ª posição no Ranking de exportações.
11. O Brasil, na temporada de reconstrução da posição de liderança regional vem consolidando uma agenda internacional. Lidera conversas, sinaliza acordos, negociações bilaterais. Enfim, é notória a representação do país nas articulações. Uma expressão disso é a indicação da Ex-Presidente Dilma Rousseff no comando do BancoBrics.
12. A habilidade do governo Lula resulta na visibilidade do Brasil em plano global. Temas como combate a fome versus produção de alimentos, indústria e tecnologia seguidos do tema clima versus Amazônia aliados às características biofísicas do Brasil permitem alçar acordos bilionários de cooperação.
13. Soberania nacional é um tema que faz parte da agenda do governo Lula. O presidente vem demonstrando personalidade política ao tratá-la nas negociações internacionais, com posição de fortalecimento e defesa dos recursos estratégicos e das estatais brasileiras.
14. Em 2018, com a vitória do Bolsonaro o ódio se espraiou. O ódio foi alimentado com as medidas institucionais como a lei de incentivo às armas, pelo discurso racista, preconceituoso e machista, além de uma tempestade de fakeNews, as notícias falsas. Tudo com intuito de confundir o povo e teve o nocivo efeito na formação ideológica de gerações.
15. O cultivo do ódio despertou no Brasil uma força sombria de violência e barbárie. O efeito fez vítimas em escala imensurável. Atingiu as nossas crianças dentro das escolas, relações nas casas, chegou aos territórios e comunidades. Um cenário de terra arrasada.
16. Com todas as ações realizadas nos quatros meses do governo Lula, ainda tem um caminho de destruição deixado por seu antecessor. Será uma reconstrução permanente, uma vez que atingiu para além das estruturais físicas, os valores humanos de toda sociedade.
17. A prática do ódio disseminado no Brasil é classificada como neofascismo (novo fascismo). Uma versão do fascismo italiano (de Mussolini) na realidade contemporânea, porém mais sofisticado. O fascismo constitui um movimento político moderno que forma e organiza o pensamento e as práticas sociais. Destaca-se também pela ideia de superioridade de raça, aproximação de ideologias librais e uso da subjetivada religiosa para fins política.
18. Neste caso, o uso da religião é o meio de internalizar e converter mentiras em verdades. A religião tem o papel dogmático de livrar a mensagem (mentirosa) de qualquer crítica. É o método de enraizamento de ideias falaciosas “na” e “sobre” a realidade voluntariamente sem qualquer senso crítico de si e do outro.
19. O vigor da democracia vem pontuando transformações. Mas, uma onda criminosa de disseminação de mentiras contra os movimentos sociais camponeses está na agenda dos fascistas. A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Movimento Sem Terra (MST) é uma prova disso, pois são apenas quatros meses de governo que, se quer, tem um convênio assinado ou processo de assentamento em curso em estágio avançado.
20. Nesse bojo, entra a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito CPMI sobre o 08 de janeiro, cuja tentativa da direita é responsabilizar o governo por ato contra si. São manobras cínicas e vazias para tirar a atenção e confundir a opinião pública sobre temas relevantes e as denúncias comprovadas contra Bolsonaro.
21. Os mais de 130 dias do governo Lula são suficientes para demonstrar a disposição em recolocar os pobres no orçamento e engrenar a retomada do crescimento da economia nacional. Lógico, que grandes desafios acompanham tais iniciativas, entre as quais está a aliança amplíssima para a governabilidade.
22. A retomada do Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), Programa de Aquisição de Alimento (PAA), ajuste no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), aumento do salário mínimo, Programa Mais Médicos, política de participação social, investimento nas universidades públicas, retomadas das obras paradas entre outras, são marcas de esperança neste período inicial.
23. A avaliação deste período é favorável, mas a correlação de força no congresso é desfavorável. A obstrução de pautas importantes vem seguida de chantagem política dos deputados que subjugam as necessidades da população aos seus interesses eleitoreiros.
24. O dramático retorno do Brasil ao mapa da fome é parte da estratégia social e econômica adotada pelos governos de Michael Temer, em especial pelo Bolsonaro e aliados que elegeram os camponeses como inimigos. Uma política estrutural de higienização social com endereço definido, com recorte de classe, gênero e raça.
25. A fome não é uma opção individual, portanto as pessoas não passam fome. As pessoas são submetidas a situação de fome. Então, a maneira adequada de aplicar o termo fome é associá-la ao termo violência. Ambas são “frutos” sem precedente da organização social do estado, da exploração do trabalho e da concentração social da riqueza.
26. A realidade da fome no Brasil, contraditoriamente, tem a ver com o aumento dos índices produtivos das commodities agrícolas, ao passo da diminuição das áreas destinadas à produção de comida.
27. O aumento da produção de commodities tem relação direta com a devastação da floresta, invasões e concessões de áreas protegidas, liberação sem limites de agrotóxicos e a abertura de frente de novos negócios com a terra, água, minérios por empresas nacionais e por estrangeiras.
28. Os recordes anuais da produção de grãos do Brasil estão associados ao aumento da fome, concentração da terra, riqueza e novos conflitos. Fortalece a justificativa de que, se combate a fome com ampla e sólidas políticas de produção de alimentos, abastecimento social e distribuição de renda.
29. A lógica adotada é o fio condutor da violenta agressão ao meio ambiente, mas sobretudo, aos camponeses e aos trabalhadores urbanos pobres. Isso se confirma com a territorialização da fome e o aumento da exploração do trabalho em ambientes de vida em condições precárias.
30. Outros indicadores são os conflitos estabelecidos em terras indígenas, área de mineração, territórios pesqueiros, comunidades tradicionais, áreas quilombolas e em áreas de assentamento de reforma agrária.
31. A destruição de políticas públicas para consumo interno empurrou os médios produtores para produção de grãos de soja e milho em função das vantagens dos altos preços internacionais, abandonando assim a produção de alimentos básicos como arroz, feijão e farinha.
32. A priorização ao agronegócio, aliada ao fim da política de estoque da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) teve e tem impacto direto na vida cotidiano da população. O aumento no preço dos alimentos tem origem nessa lógica. Que por consequência, provocou um efeito na escassez de produtos (trigo, arroz, feijão) necessários na dieta alimentar da população, obrigando a importá-los de outros países.
33. O abandono das políticas de produção para consumo interno tive efeito no acesso devido tanto ao preço, quanto na qualidade dos alimentos. Essa conta chegou por meio do aumento do empobrecimento extremo das famílias, com 33 milhões de famintos e 120 milhões em algum estágio de insegurança alimentar.
34. Sendo assim, a solução da fome não está somente na distribuição de comida e acesso ao alimento. Passa rigorosamente pela mudança estrutural do Estado e da organização do trabalho e socialização da riqueza.
35. Atravessar este período exigirá muito de toda sociedade, dos movimentos sociais e das organizações políticas do Brasil. As convicções estão sendo disputadas no campo das ideias. Extrair firmeza ideológica será um feito frente às contradições do dia-a-dia, inclusive nos territórios camponeses.
36. Mas sobretudo, é hora de mobilizar as forças camponesas para produção de alimentos em quantidade e qualidade suficientes para alimentar os trabalhadores deste país. Organizar as lutas populares de massa, com rigor das ruas e a mística dos nossos antepassados.
Brasília – DF, maio de 2023.
[1] Taxas estabelecidas pelo Banco Central do Brasil
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